Fotos de Milão
O silêncio me fez dormir
Para a vida.
Ouvi a brisa do vento,
A garoa batendo na terra seca,
O cheiro da terra molhada,
E meu corpo, aos poucos, indo...
Partindo... me deixando.
No reflexo do espelho,
Eu ainda era uma garota.
Tinha no colo um corpo franzino,
Que sugava de mim
O que ainda restava
De ser menina.
E, aos poucos, me tornei mulher.
Meus seios se enchiam de leite,
Sentia meu corpo se transformando
Em deleite para uma boquinha faminta.
Mais uma vez,
Uma gravidez.
Outra vez, mãe:
De um menino e de uma menina.
Me realizei como mulher.
Voei no tempo, descalça,
E os meus pés crus e soturnos
Me faziam percorrer a vida,
Pelos ares, entre nuvens,
Que tornavam-se negras
E traziam tempestades.
Inundavam meu corpo
Com tanta força
Que, na jorrada das águas,
Me levavam rio abaixo.
Perdi raízes, como as árvores;
Perdi folhas, como as flores;
Perdi pétalas, como as rosas.
Joguei sementes naufragadas
Em águas turbulentas.
Gritei:
"Preciso viver!"
E sabia que precisava deixar um rastro,
Retornar,
Me agarrar ao mastro.
Afundei meu corpo
E minha alma inerte,
Para acumular energia,
Força,
Certeza e esperança
No meu eterno amante.
Foi no seu olhar que vi balbuciar:
"Levante! Levante!"
Abri os olhos...
Ele não estava mais lá,
Apenas nas minhas lembranças.
O silêncio me fez acordar.
Sua voz ecoa nos meus pensamentos:
Para a vida.
Ouvi a brisa do vento,
Vi um raio de luz,
A garoa batendo na terra seca,
O cheiro da terra molhada.
E meu corpo, aos poucos, voando...
Sonhando... voltando.
As sementes que ainda estavam no caminho,
Jogadas por mim,
Brotavam jasmins,
Trazendo de volta à memória
A vida de um menino.
Colhi os grãos
Do próprio fruto,
Germinei no meu jardim.
À semente dei o nome de Matheus.
E segui minha vida,
Para ser feliz,
Com os meus.
Autora: Isabel van Gurp
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