Se vão em grãos
Se vão em grãos,
levados pelo sopro dos ventos,
como pensamentos soltos
que a alma esqueceu de guardar.
Semeiam em teia invisível,
sementes que viajam,
tocam o ar,
descem nos silêncios
da terra fértil.
Caem em levadas,
descansam no útero da Terra-Mãe,
que os acolhe no ventre úmido,
nutrindo o embrião
com o leite das raízes
e o calor do seu coração.
O poder do ciclo,
endosperma sagrado,
escorre pelas mãos dos deuses,
que giram o mundo
como quem molda um vaso
sobre a roda do tempo,
cambaleando entre auroras e crepúsculos.
Na arte de recriar a vida,
se vão em grãos,
jorrados como pérolas ao vento,
nus em tegumento,
carregando em silêncio
o segredo do renascer.
Transformam-se em cores
antes de se entregarem ao fim.
Bruxos e cogumelos
erguem-se do chão,
fungos que dançam
nas madrugadas úmidas,
lembrando que até na sombra
há criação.
Brotam por si,
sem mestre ou dono,
arte pura em apelo,
coexistência e pulsar,
pintando na tela da natureza
o retrato do eterno.
E assim segue a viagem da vida,
recomeço de um fim,
ciclo que se refaz
mesmo sem elos,
pois no silêncio da terra,
cada grão que se vai
é também um grão
que volta.
Autora: Isabel van Gurp
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